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Encanto. Ciência, sustentabilidade e poesia vegetal

Encanto. Ciência, sustentabilidade e poesia vegetal

Diogo Formiga © ffmag

Por detrás da singular experiência proporcionada pelo Encanto, o restaurante vegetariano com uma estrela Michelin liderado por José Avillez, está a mente inquieta e criativa de Diogo Formiga, o seu chefe de cozinha. Com uma formação em biologia marinha, o chef combina ciência e técnica culinária para converter os vegetais nos verdadeiros protagonistas da alta cozinha portuguesa.

No seu dia a dia, a cozinha de Formiga reflete a essência do Encanto: sustentabilidade, respeito pela sazonalidade e uma obsessão por aproveitar ao máximo os recursos naturais. Discreto e profundamente analítico, este chef encontrou na gastronomia vegetariana um meio para explorar a sua paixão pela natureza e estabelecer ligações com pequenos produtores que partilham a sua visão. «Sou quadrado na cozinha, mas tranquilo fora dela», confessa. Sob a sua liderança, Encanto inspira uma mudança na forma como pensamos e valorizamos a nossa alimentação. Em cada prato, Formiga converte o vegetal em magia, fazendo do Encanto uma verdadeira homenagem ao planeta.


 

Como surgiu a sua paixão pela cozinha?
A minha relação com a cozinha começou há 12 anos. Antes estudei biologia e trabalhei num escritório durante um ano, mas não era feliz, estava a enlouquecer. Decidi mudar de vida e dedicar-me a algo que realmente me apaixonasse. Sempre tinha gostado de cozinhar para a minha família e amigos, por isso arrisquei. Comecei a trabalhar num restaurante no Porto, e desde o primeiro dia soube que era isso que queria fazer. Foi como se uma faísca ateasse um incêndio. Embora a gastronomia não fizesse parte dos meus planos iniciais, afinal acho que sempre esteve ali, escondida, à espera do momento adequado.

Maçã, castanha e cogumelos selvagens. Restaurante Encanto de José Avillez. Lisboa

Maçã, castanha e cogumelos selvagens © Encanto

Como foi a sua transição para a cozinha vegetariana?
Foi um processo muito natural. Nunca tive uma orientação 100% vegetariana, mas, quando surgiu a oportunidade de me juntar à equipa do Encanto, soube que era um desafio único. Trabalhava no Belcanto quando o José Avillez me propôs liderar o Encanto. Fiquei cativado pela ideia de cozinhar sem carne nem peixe, porque era mais complicado e, portanto, mais divertido. No início, chegámos até a pensar em usar alguns elementos de origem animal nos caldos, como a sopa de mexilhão, mas apercebemo-nos logo de que podíamos conseguir a intensidade de sabor que procurávamos apenas com vegetais. A decisão de ser 100% vegetarianos foi quase imediata e marcou o espírito do restaurante.

Qual a diferença entre o Encanto a outros restaurantes vegetarianos?
Acho que o Encanto celebra os vegetais a partir de uma abordagem muito científica e criativa. Não só usamos o fruto de uma planta, mas também as suas folhas, raízes, flores ou qualquer parte que seja comestível. O nosso objetivo é revelar ao cliente o potencial oculto de cada ingrediente.

Cozido de legumes de outono. Restaurante Encanto. Lisboa

Cozido de legumes de outono © Encanto

A nossa cozinha é completamente sazonal. Isso requer muita planificação e investigação. Por exemplo, as ervilhas só estão disponíveis durante um mês. Se não tivermos um prato preparado para esse momento, simplesmente não o servimos. Este nível de pormenor e respeito pelo produto é uma das nossas marcas de identidade. Para além disso, trabalhamos lado a lado com os pequenos produtores locais que partilham a nossa paixão. Ligo-lhes pessoalmente todos os dias para planificarmos juntos a próxima época. É um esforço enorme, mas essencial para garantir a qualidade e sustentabilidade do que fazemos.

 

O Encanto celebra os vegetais a partir de uma abordagem muito científica e criativa

 

Como gerem a sustentabilidade no Encanto?
A sustentabilidade é uma prioridade absoluta. No Encanto não usamos plásticos, nem sacos de vácuo, nem película transparente. O nosso azeite chega em bidões que devolvemos ao fornecedor para a sua reutilização. Está tudo pensado para minimizar a nossa pegada ambiental. Para além disso, mantemos uma relação direta com os produtores, o que nos permite evitar desperdícios e apostar por práticas tradicionais e responsáveis. Por exemplo, colaboramos com um produtor artesanal de sal no Algarve, que trabalha apenas com a filha. Este tipo de alianças refletem o nosso compromisso com a sustentabilidade e o respeito pelos recursos. Por outro lado, o Encanto também funciona como um laboratório para o grupo José Avillez. As soluções que implementarmos aqui são estudadas para as aplicarmos noutros restaurantes do grupo. É uma forma de ir mais além e de ter um impacto positivo em toda a nossa estrutura.

Sala de jantar restaurante Encanto, Lisboa

Sala de jantar © Encanto

O que significou para si a estrela Michelin obtida no primeiro ano do Encanto?
Foi algo incrível. Não era algo de que estivesse à espera. Porém, quando chegou, foi uma alegria enorme. Lembro-me de que, durante a gala, não queria subir ao palco porque não gosto de ser o centro das atenções, mas o José Avillez insistiu e levou-me a fazê-lo. Foi um momento inesquecível, mas no dia seguinte já estávamos de volta à cozinha, a trabalhar com mais motivação do que nunca. A estrela é maravilhosa, mas o mais importante continua a ser a opinião dos nossos clientes.

Como imagina o futuro do Encanto?
Imagino um Encanto cada vez mais conectado com a natureza. Vamos inclusivamente fazer um primeiro pop-up do Encanto na Casa Nossa. Vai ser muito importante no sentido de podermos fazer o que fazemos num contexto rural e aprofundar a conexão da equipa com a natureza. Imagino um Encanto que combina cada vez mais investigação científica com a cozinha de forma a fechar o ciclo de sustentabilidade. Isso seria um sonho tornado realidade. É extremamente difícil, mas desafiante e emocionante ao mesmo tempo, encontrar soluções sustentáveis no meio da cidade.

Continuamos a evoluir e a transmitir através da criatividade a nossa mensagem: os vegetais podem ser os protagonistas da cozinha, e o seu potencial é infinito.

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