
Miguel Teixeira
Miguel Teixeira, com mais de 20 anos de carreira na cozinha, mantém a mesma energia, humildade e paixão que o impulsionaram desde o início. Reconhecido pela sua abordagem transparente e pela habilidade de liderar equipas, este chef português transformou a aprendizagem e a colaboração nos pilares da sua trajetória. Desde os primeiros passos no restaurante da Fundação Serralves até à posição de Chef Executivo no Corinthia Lisbon, e mais recentemente como Chef Corporativo do grupo Corinthia, Miguel construiu uma carreira sólida, deixando uma marca memorável em cada projeto.
Nesta entrevista, exploramos os novos desafios que enfrenta na companhia e refletimos sobre os valores e experiências que moldaram a sua trajetória. Conversamos também sobre como concilia as suas novas responsabilidades com a gestão dos dois restaurantes que criou no Corinthia Lisbon, Erva e Soul Garden. Miguel Teixeira partilha como combina as suas raízes, a paixão por viajar e a sua visão criativa para oferecer experiências gastronómicas memoráveis.
Com mais de 20 anos de carreira na cozinha recentemente assumiu funções de Chef Corporativo num grupo de hoteis de luxo e em forte expansão. Como descreve a sua trajetória profissional até aqui e o que representa para si assumir esta nova posição?
Esta posição representa a concretização de um objetivo pelo qual trabalhei arduamente ao longo de toda a minha vida. Foram mais de 20 anos de total dedicação, marcados por inúmeros sacrifícios — como passar Natais e passagens de ano longe da família e amigos. É uma profissão onde trabalhamos para proporcionar momentos de alegria aos outros, muitas vezes à custa dos nossos próprios. Pelo caminho, enfrentei desafios que me moldaram e acumulei aprendizagens valiosas. Este papel é, sem dúvida, o reconhecimento de todo o esforço, paixão e entrega que sempre dediquei à minha carreira.
Cada experiência, cada erro e cada conquista foram os alicerces que me moldaram ao longo dos anos. Hoje, sinto-me realizado, mas não acomodado. Pelo contrário, estou mais motivado do que nunca a continuar a crescer, a inspirar equipas, a inovar e a transformar ideias em conceitos únicos. Tudo isso com o mesmo amor e respeito pela Cozinha que, desde o início, tem sido a minha maior paixão e o motor da minha jornada.
Como é que consegue conciliar as suas novas funções como Corporate Executive Chef com a gestão dos dois restaurantes, Erva e Soul Garden que criou em Lisboa?
Não é fácil, mas o segredo está em contar com uma equipa de confiança. Tenho o privilégio de trabalhar com líderes excecionais que asseguram a gestão diária das operações. Confio e delego nas pessoas certas, mas faço questão de manter uma ligação próxima, participando ativamente nas decisões estratégicas e acompanhando de perto o desenvolvimento dos restaurantes, mesmo à distância.
Cada visita a Lisboa é uma oportunidade valiosa para reforçar a harmonia, inspirar as equipas e assegurar que continuamos a inovar e a superar expectativas. Paralelamente, as minhas novas funções oferecem uma visão mais ampla, que aplico estrategicamente nos restaurantes, garantindo que permanecem competitivos, dinâmicos e alinhados com as exigências de um mercado em constante evolução.
O grupo está em forte expansão a nível global. Como adapta a experiência gastronómica para manter um padrão de excelência, respeitando ao mesmo tempo as características culturais de cada destino?
O segredo está em equilibrar consistência e autenticidade. Garantimos padrões elevados de qualidade e serviço em todas as propriedades, ao mesmo tempo que adaptamos menus e conceitos às influências e características locais. Trabalhamos em estreita colaboração com produtores regionais, integrando ingredientes típicos para criar experiências que unem o luxo a um forte sentido de identidade cultural.
Além disso, estabelecemos parcerias estratégicas com chefs locais, que enriquecem e diversificam a nossa oferta. Em Bruxelas, por exemplo, colaboramos com os renomados chefs David Martin e Christophe Hardiquest, referências incontornáveis na gastronomia belga, para elevar ainda mais a experiência dos nossos hóspedes.
Como consegue equilibrar a padronização da qualidade com a personalização das experiências gastronómicas em cada um dos hotéis?
A chave está em estabelecer padrões claros para a qualidade dos ingredientes, apresentação e serviço, combinados com a flexibilidade necessária para incorporar elementos locais. Enquanto a excelência no serviço permanece inegociável, os pratos podem ser ajustados para refletir as expectativas culturais e destacar ingredientes regionais, garantindo uma experiência que equilibra autenticidade e consistência com os valores da marca.
Essa abordagem não só preserva a identidade de cada destino, como também oferece liberdade criativa aos chefs, permitindo-lhes inovar e desenvolver menus únicos e personalizados que enriquecem a experiência gastronómica.
Na sua opinião, qual é o papel da gastronomia em proporcionar uma experiência de luxo que se destaque no mercado hoteleiro?
A gastronomia é o coração da experiência de luxo. Mais do que oferecer comida de qualidade, trata-se de criar momentos únicos e memoráveis. Um prato bem apresentado, um serviço impecável e um ambiente cuidadosamente pensado têm o poder de transformar uma estadia em algo verdadeiramente inesquecível.
No mercado hoteleiro, a gastronomia é um dos grandes fatores de diferenciação. Todos os hotéis oferecem quartos, mas poucos contam com restaurantes e bares que proporcionem experiências genuinamente únicas. No grupo Corinthia, a gastronomia é um elemento central de cada projeto, como exemplificado no hotel de Bucareste, onde o luxo se combina com três espaços de restauração distintos, cada um pensado para surpreender e encantar os nossos hóspedes.
Quais são os novos desafios que enfrenta atualmente na companhia e como pretende superá-los?
O maior desafio é a escassez de mão de obra qualificada, uma realidade que impacta toda a indústria. Sem equipas bem preparadas, torna-se mais difícil garantir a consistência, a qualidade e a experiência de luxo que os nossos clientes esperam. Para enfrentar este desafio, estamos a investir fortemente na formação interna e no desenvolvimento do talento existente, através de programas de treino eficazes e direcionados.
Paralelamente, estamos empenhados em criar um ambiente de trabalho mais atrativo e motivador, que não só inspire os colaboradores a permanecerem connosco, mas também atraia novos talentos que queiram fazer parte da nossa equipa.
Após mais de duas décadas de carreira, o que o continua a motivar e a fazer crescer como chef?
O caos diário da restauração e hotelaria é, ao mesmo tempo, desafiador e fascinante. Há dias em que as dificuldades me fazem questionar tudo, mas basta um novo dia começar para me sentir revigorado e cheio de paixão pelo que faço. É esse contraste, essa intensidade, que me mantém motivado e profundamente conectado com o que gosto de fazer.
Se pudesse voltar ao início, que conselho daria ao Miguel que estava a começar?
“Tens a certeza de que queres mesmo isto?” (risos). Honestamente, o conselho seria simples: aproveita cada momento, até os mais desafiantes, porque é neles que mais crescemos. Os erros são inevitáveis e fundamentais — quem não erra, simplesmente não faz.
Também diria para ouvir sempre, seja um mentor experiente ou um jovem com ideias frescas, porque as melhores inspirações podem vir de onde menos esperamos. E, acima de tudo, nunca percas o brilho nos olhos e o entusiasmo de quem entra numa cozinha pela primeira vez. É essa paixão que abre portas, inspira os outros e mantém a magia viva.
Para terminar – Como vê o futuro da Restauração?
Vejo um futuro em que a sustentabilidade e a autenticidade se tornam cada vez mais centrais. As pessoas não procuram apenas boa comida e serviço, mas experiências que envolvem um propósito maior. O respeito pelos produtos locais, a redução do desperdício e as práticas éticas serão, sem dúvida, tendências em destaque.
A tecnologia terá um papel crescente, especialmente na eficiência e na personalização, mas acredito que o toque humano será sempre insubstituível. No fim, a verdadeira essência da gastronomia permanece a mesma: criar memórias, conectar pessoas e contar histórias à volta da mesa, onde cada prato tem uma história a contar.