A 120 metros de altura, suspenso sobre o rio Tejo, num miradouro envidraçado com uma vista de 360º na Torre Vasco da Gama do Hotel “SANA”, no Parque das Nações de Lisboa. Assim é o novo projeto de Martín Berasategui, Fifty Seconds, que abrirá as suas portas em meados de novembro de 2018. Cinquenta segundos é o tempo que o elevador, uma caixa de vidro, demora a subir desde o hall do hotel até à sala do restaurante. Terá 30 lugares para os comensais, uma decoração cosmopolita, na qual se destacam os bronzes e o azul-cobalto, e tudo isto com a assinatura de um dos homens mais respeitados do panorama gastronómico internacional.
Pouco se pode dizer de Berasategui que ainda não tenha sido dito. É, sem dúvida, um dos cozinheiros espanhóis com mais projeção internacional. O único que possui 8 estrelas Michelin. Trabalhador incansável, diz que o seu vício é trabalhar. Basco, de San Sebastián, e conhecido internacionalmente, tem 58 primaveras e parece nunca ter conhecido a derrota. Com 26 anos, pouco tempo depois de ter ficado à frente do restaurante da família, um estabelecimento tradicional chamado “Bodegón Alejandro”, recebeu a sua primeira estrela. A partir daí a sua trajetória foi imparável. O segredo do seu sucesso? «A coragem», diz apertando o punho e esticando o braço. É o seu grito de guerra. É garra, é força, é pôr o melhor de nós próprios em cada coisa que fazemos. O outro segredo do seu sucesso? A sua mulher. Reconhece que não teria chegado até aqui sem ela. Brinca: «Digo logo aos meus amigos que a minha mulher é 98% do sucesso do Martín». E a sua filha, que também trabalha com ele. «É o melhor que fiz na minha vida», reconhece, «e a pessoa a quem mais peço conselhos. Têm as duas o mesmo perfil: falam pouco e trabalham muito», refere.
Martín, como gosta que lhe chamem, é um homem simples. Parece calmo. Embora seja um vulcão. Anda sempre metido em novos projetos. Se não é um livro de cozinha, é uma aula magistral, ou uma palestra, uma assessoria gastronómica à cozinha de um restaurante ou de um hotel ou um encontro com a imprensa. É surpreendente como é que consegue estar envolvido em tantas coisas ao mesmo tempo. Explica-nos que não poderia fazê-lo sem a sua equipa. Na verdade, o seu restaurante é uma escola. Passaram por aí inúmeros aprendizes. E quando vê algo neles, uma seiva nova, renovada, forma equipas novas com eles para abrir «montras pelo mundo». «Se eu não tivesse feito isto e tivesse ficado fechado na parte velha de San Sebastián, sem sair do Boulevard, teria perdido imensas oportunidades para o meu trabalho, para a minha profissão e para o meu país. Sou um embaixador dos produtos e da cozinha», acrescenta com paixão.
Tocando as portas do céu no Fifty Seconds by Martín Berasategui
Tenho curiosidade por saber porque é que escolheu precisamente Lisboa como primeiro destino europeu fora de Espanha para se afirmar, quando sabemos bem que recusou inúmeras propostas noutros países. «Lisboa é impressionante. Cresce a um ritmo extraordinário», diz, «tenho uns clientes fantásticos, que se apaixonaram pelo que fazemos e que me apresentaram um projeto ao qual foi impossível dizer que não», acrescenta enquanto os seus olhos se enchem de emoção, como se fosse uma criança com um brinquedo novo. «Chegamos, entramos num elevador de vidro e, de repente, quando passamos o último andar do hotel, ficamos em suspenso sobre quatro vidros no vazio e, pouco tempo depois, estamos no restaurante Fifty Seconds by Martín Berasategui… é um projeto incrível, como é que eu podia recusar?»
A sala vai ter lugar para 30 comensais. Quase como em casa – refiro-me à lotação limitada. Ri-se às gargalhadas. «Bem, quem me dera ter uma casa como esta. Tem uma vista de 360º sobre toda a Lisboa e o rio Tejo. Fizemos tudo em exclusivo para este projeto, louça, faqueiro, serviço de cristal, mobiliário, decoração…»
Quanto àquilo que podemos encontrar no Fifty Seconds, o chef é bem claro: «Vão ver o que veem em todos os restaurantes que abri desde que tinha 20 anos: um cozinheiro que veste mesmo a camisola. Um cozinheiro que dedicou a vida à arte gastronómica. Um cozinheiro que acredita no êxito do trabalho em equipa, do nós e não do eu. Um cozinheiro que não entende que não se una o saber e a nobreza dos profissionais que andam há muito tempo nesta profissão com a frescura da gente nova». A verdade é que grande parte do pessoal, cerca de 90%, é de origem portuguesa. Muitos deles já passaram por alguma cozinha do próprio Martín Berasategui. Assim, Filipe Carvalho será o chef responsável pela cozinha e Maria João Gonçalves será a chef pasteleira. Por sua vez, Inácio Loureiro será o chefe de sala e Marc Pinto o sommelier principal.
A humildade como filosofia de vida de Martín Berasategui
Para este mágico da cozinha, a humildade é uma maneira de viver. O sucesso não é dele, é «nosso». Admite que, sem as suas «superequipas», os seus empregados que «foram uma joia», não teria tido o sucesso que tem. Porque para ele é tudo importante. É fruto do trabalho em equipa. E a equipa é o cozinheiro, o segundo cozinheiro, mas também o responsável pelo empratamento, o empregado de mesa, o sommelier, o peixeiro, o talhante, o fruteiro… E a sorte também conta. Como diz, «Com 20 anos, depois de ter perdido o meu pai, tive a sorte de a primeira obra do Bodegón Alejandro ter como avalista o pastor de Igueldo, Eusebio Balda. Três ou quatro anos depois daquela obra, atribuíram-me a primeira estrela Michelin e isso fez-me sonhar como cozinheiro. E, graças a isso, nasceu o primeiro projeto meu que todos conhecem. A sorte é tão importante quanto isso. Há gente que sai à rua de bicicleta e de repente se despista e passa um carro que, pum, acaba com ela. Teve azar, não foi como o Martín, que teve muita sorte. Tive uns pais fantásticos, uma tia incrível, uma filha e uma mulher maravilhosas, uns amigos fabulosos. É tudo isso que faz com que tenhamos essa coragem que devemos ter».
E, quanto à criatividade, de onde é que sai esse manancial de criatividade de Martín Berasategui? «Olhe», responde, «a criatividade é como uma torneira. Quando dedicámos toda a nossa vida à arte gastronómica e renunciámos a muitas coisas por isso, é como abrir uma torneira. Abrimos a torneira e saem coisas novas. Porém, é verdade que o nível de criatividade não é igual todos os dias. Umas vezes estou muito criativo, outras vezes pouco e outras simplesmente nada. A verdade», refere, «é que comecei como aprendiz com 15 anos e 43 anos e meio depois continuo a ser um aprendiz».